sandra aka margarete ~ acknowledgeyourself@gmail.com

podemos morrer sozinhos, mas ninguém morre sozinho*

cerca das 8:30 am passei pelo gabinete do Dr.b, só precisava de recolher uma informação simples, trocámos cumprimentos, expliquei ao que ia, ele aproveitou para me dar informação acerca de um cliente, deixou-me a par dos últimos acontecimentos - as coisas não correram bem - sorriu a tentar convencer-me de que a vida é mesmo assim, ao mesmo tempo que mo dizia - é assim, a vida - não foi capaz de mentir com os olhos e não ficámos num silêncio poetizado em que julgamos haver sintonia sem a confirmar, verbalizámos - custa muito, quando a vida é assim, a vida é assim e custa; o Dr.b é o meu ídolo, até há algum tempo, precisamente a semana passada, não conseguia identificar pessoas que suscitassem em mim o sentimento de fã; foi num dia em que o encontrei na cidade, tão ele, continuando a ser ele sem o uniforme, que percebei - tenho aquele homem num pedestal, sinto privilégio de poder trabalhar com ele, se alguém projectasse algo a querer melhorado nele, é um alguém que pressupõe a existência de um ser humano perfeito; entre escritores, músicos, pintores, fotógrafos, fui encontrar um ídolo, de carne e osso e voz, e sinto-me feliz por isso; sinto-me livre para idolatrar sem cair.
«Corpos macilentos, rostos cinzentos, amarelados, fácies tumefactas, por trás das quais encontrei pessoas carregadas de uma história muitas vezes dolorosa, feita de amor e miséria, de impulsos muitas vezes insatisfeitos... seres vivos, sequiosos de amor e preocupados em não partir sem ter restabelecido a ligação com a verdade dos seus sentimentos (...) para além de todas as dificuldades, de todos os momentos de desepero, para além das tristezas ou das crises de desalento, sempre tive a surpresa de me sentir cada dia mais viva, enquanto à minha volta se julga por vezes mórbida este frequentação assídua da morte.»
Marie de Hennezel in Diálogo com a Morte
* Ninguém Morre Sozinho, título de Daniel Sampaio

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